terça-feira, 20 de setembro de 2011

Acensibilidade!


Não, não esta escrito errado! Esse foi somente um truque, um meio que encontrei para chamar a atenção para alguns fatores que considero bastante importantes: acessibilidade e sensibilidade em primeiro plano e especialidade em segundo.
O conhecimento em nosso tempo é caracteristicamente fragmentado. Temos, cada dia mais, especialistas em determinados campos bastante específicos. Especialista em torção de porcas de rosca torta de 8/34 de polegada com rosqueadeira de mira a laser com lente de aumento de 24x angulada. Brincadeirinha! O fato é que nosso conhecimento está tanto mais específico quanto fragmentado. Perdemos a articulação, a vinculação de um conhecimento com outro. Cada um cuida de sua própria especialidade e em alguns casos o “todo” não se encaixa.

Na São Paulo de épocas natalinas vemos nos letreiros de vários ônibus a inscrição “Boas Festas!” se alternando com o letreiro que oferece o destino final e seu número de código. Lampadinhas pontilhadas se entrelaçando umas nas outras que vistas de longe e em movimento transformam-se e verdadeiros borrões ilegíveis. Os míopes ocasionais – aqueles que precisam de óculos, mas resistem em usá-lo em público -, apertam seus olhos para tentar em vão ler o letreiro e quando danado chega ao limiar da distância, onde restariam alguns milésimos de segundo para ler o letreiro e saber qual o destino do coletivo para darmos o sinal de parada lemos: “Boas festas!”. Certamente essa não é a expectativa, tampouco o destino do usuário. Alguma boa alma, quiçá tendo lido sobre marketing institucional teve a brilhante idéia do letreiro, mas não teve a sensibilidade de se colocar no lugar do passageiro e se dar conta da dificuldade que a luminosa idéia poderia provocar.

Contudo, digamos que o míope leitor tenha tido a sorte de flagrar o que realmente queria e seja realmente esse destino que lhe interessa. Dá o sinal, o ônibus pára e sendo ele um cidadão típico, de estatura mediana, terá certamente - mesmo gozando de plena saúde física -, severas dificuldades de adentrar ao coletivo. Isso porque a altura do degrau é, em geral, bastante bem elevada. Não obstante, tendo efetuado o hercúleo esforço de escalar os degraus, ao se desgarrar por um breve instante das barras de segurança apenas para acessar o bolso e pegar seu bilhete para o pagamento da passagem, entra novamente em apuros, pois, o motorista que seria aprovado com louvor na prova para transporte de fardos de feno, arrancou com seu veículo projetando o incauto passageiro na direção da roleta.

As autoridades buscam minimizar as dificuldades de acessibilidade criando secretarias especiais. O produto do trabalho especializado, ao menos em Sampa salta os olhos. O transporte coletivo dispõe de assentos reservados a idosos, gestantes, e portadores de necessidades especiais. Já existem vagas de estacionamento prioritárias. A cada esquina de ruas movimentadas vemos pisos tácteis em socorro aos deficientes visuais, guias rebaixadas permitindo autonomia aos cadeirantes, mas como disse antes o todo não se encaixa. As dificuldades que relatei no início não incidem sobre a parcela da população com necessidades especiais, mas sobre todo o restante com necessidades comuns. Não temos apenas um problema de acessibilidade, mas de sensibilidade. Se as demais secretarias deixam ao encargo das secretarias especializadas o problema de acessibilidade elas mesmas se desoneram da preocupação. Com isso vemos pelos diversos corredores de ônibus espalhados pela capital, enormes plataformas elevadas sem nenhuma utilização e que se transformaram desnecessariamente em obstáculos adicionais aos transeuntes. 

Que exista a necessidade de especialistas em acessibilidade, mas precisamos todos ter a sensibilidade e retomar para si a preocupação com o outro. Não se trata de consultar a secretaria especializada, mas de nos imbuirmos todos da sensibilidade da consideração. Não há que se criar todo um projeto para posteriormente efetuar as adequações de acessibilidade, mas permitir que a sensibilidade permeie o projeto de cima a baixo do inicio ao fim. Também não se trata de criar leis ou normas que devem ser seguidas à risca. Tampouco se trata de um ônus exclusivo das autoridades, mas de experimentarmos sentir na própria pele a dor do outro. Temos o costume de dizer: - Eu fiz minha parte! Acreditando que se cada um fizer sua parte uma se encaixa na outra e assim constituímos um todo. Mas não se tratam de partes, mas sim de visões parciais e limitadas do todo. Visões parciais sem necessariamente limites restritos ou isolados. Nesse caso a “minha parte” invade, se mescla, se confunde, impacta a parte do outro, tanto quanto a parte do outro afeta a minha. Minha parte não se dá por concluída sem a parte do outro. Se a sensibilidade não atravessar a ambos as partes não vão se encaixar no final. Teremos com isso obras monstruosas apenas fruto de encaixes mal feitos. 

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